Taís Farias Ribeiro

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Os dados consolidados de 2021 do Cenp-Meios, relatório que reúne os investimentos em mídia realizados pelas agências participantes por ordem de seus clientes, divulgados pelo Cenp – Fórum da Autorregulação do Mercado Publicitário, totalizam informações de 298 agências, sendo 245 matrizes e 53 filiais, que reportaram faturamentos para construir a base de dados. O balanço avaliou o período de janeiro a dezembro do ano passado e revelou uma recuperação do setor depois dos percalços enfrentados na fase mais crítica da pandemia da Covid-19.

De acordo com as informações, os anunciantes investiram R$ 19,7 bilhões em mídia. O valor é superior aos R$ 14,2 bilhões reportados em 2020, com dados de 217 agências, e maior, até mesmo, que os R$ 17,5 bilhões investidos em mídia no ano de 2019, anterior à pandemia, quando 226 agências participaram do painel. Em termos de faturamento, no ano de 2021, todos os meios pesquisados (cinema, internet, jornal, mídia exterior, rádio, revista, TV aberta e TV paga) cresceram. No entanto, um deles se sobressaiu. A internet, que já vinha ganhando força, registrou crescimento de 74,2% nos planos de mídia de 2020 para 2021.

Com isso, o digital conquistou seu maior share na história do painel: 33,5%. Na prática, isso quer dizer que, a cada R$ 100 investidos em publicidade no Brasil via agências participantes do Cenp-¬Meios, R$ 33,50 vão para a internet. Essa é a maior participação já conquistada pela internet desde que o relatório começou a ser feito, em 2017. O digital segue atrás somente da televisão aberta em faturamento, mas diminui sua distância, já que o share da TV era de 51,8% em 2020 e caiu para 45,4% no ano passado.

Crescimento atrasado

Quando a questão são fatores que levaram a esse crescimento acelerado, os profissionais de mídia não titubeiam em responder que o movimento é reflexo da mudança de comportamento do consumidor. “Sempre que falamos de tendências do mercado de publicidade e investimentos em mídia, é importante mencionar que as marcas, através de suas agências, coletam e analisam os dados do consumidor para a tomada de decisões. Portanto, o cenário do crescimento do share da internet no Brasil é também o reflexo da mudança nos hábitos dos consumidores das marcas destes anunciantes”, aponta Fabio Urbanas, vice-presidente de mídia da WMcCann. Ele cita, por exemplo, o avanço no número de brasileiros que contam com acesso à internet.

De fato, em março, o estudo “O abismo digital”, da PwC Brasil em parceria com o Instituto Locomotiva, buscou mapear o acesso à internet no Brasil e estabelecer relações entre conectividade e desigualdade socioeconômica. De acordo com a pesquisa, 81% da população com 10 anos ou mais usam a internet, ainda que apenas 20% do contingente tenha acesso de qualidade à rede. “Sendo assim, a soma de diversos fatores, como o crescimento da penetração da internet, que se torna cada vez mais acessível em diversas classes, o consumidor que aprende a usá-la para comprar de forma cada vez mais diversa e o aumento de suas atividades em redes sociais e consumo de conteúdos, está fazendo o brasileiro gastar mais horas em frente às telas digitais”, analisa Urbanas.

Para Aga Porada, diretora geral de mídia da Africa, o crescimento da internet no Cenp-Meios 2021, na verdade, está atrasado. “Primeiro, os consumidores começam a ditar as tendências e só depois o mercado vai atrás. No caso de digital, o atraso é bem maior que nos outros canais”, descreve a executiva. Para além de um aumento no número de pessoas com acesso à internet, é importante destacar que outras indústrias, como o próprio mercado de entretenimento, também experimentaram a digitalização. Como destaca o head de mídia da Talent Marcel, Herbert Gomes: “Outro ponto importante são os conteúdos disponíveis. Hoje, temos um grande crescimento de conteúdos ao vivo e as principais emissoras e plataformas disponibilizando gratuitamente ou de forma paga seus conteúdos e isso agrega valor ao meio”, explica. A pandemia entra na conta dos executivos para explicar tal movimento, assim como um desejo de investir em meios mais assertivos, como um efeito colateral do período de contenção de investimentos.

“Durante o ano de 2021, tivemos dois grandes fatores que influenciaram a escolha dos meios. O primeiro foi a pandemia, que forçou as pessoas a continuarem em casa e restringiu a circulação no comércio de rua. Isso fez com que o digital tivesse uma maior relevância nas campanhas de conversão e, consequentemente, aumentasse o seu percentual de investimento. O segundo fator estaria associado à busca pela assertividade e por um ROI cada vez mais competitivo”, explica Helo Goldman, vice-presidente de mídia e performance da Leo Burnett.

Efeito pandêmico

Para a diretora geral de mídia da Africa, nos próximos anos, os investimentos no digital devem crescer. “Ainda não refletem a audiência”, opina Aga Porada. No ano passado, um estudo da Fundação Getúlio Vargas apontou que o País já contava com 440 milhões de dispositivos digitais em uso — computadores, notebooks, tablets e smartphones.

O vice-presidente de mídia da WMcCann concorda que o crescimento deve continuar, mas defende que gatilhos de aceleração como o de 2021 podem não se repetir tão cedo. “O que deve continuar acontecendo é que o número de internautas tende a se estabilizar, ou seja, a penetração não dará grandes saltos nos próximos anos, mas o brasileiro que navega na internet deve continuar aumentando suas atividades digitais, como o tempo de uso de mobile e desktop, e principalmente de consumo de conteúdos através de streaming e de podcast, assim como também aumentará suas horas gastas com games”, aponta Fabio Urbanas.

Ele continua: “Todo esse movimento de mudanças de hábitos deve continuar refletido nos investimentos, pois as marcas procuram crescer esforços em vídeos online, social media e conteúdo de influenciadores digitais. Mas o ritmo deve voltar a patamares próximos aos que estávamos observando antes do fenômeno de aceleração do consumo digital proporcionado pela pandemia”, afirma. Helo Goldman prevê, inclusive, uma resposta dos demais canais. “Com a melhora na pandemia, os meios que estavam represados devem voltar a crescer e aumentar a participação atual nos investimentos publicitários. Por outro lado, o digital continua com o desafio de trazer novidades e inovação para manter esse share no pós-pandemia”, conta a vice-presidente de Mídia e Performance da Leo Burnett.

Desafios estruturais

De fato, ainda que o cenário seja de otimismo, não faltam desafios para que o digital mantenha o patamar e siga crescendo em share. Aga Porada ressalta o obstáculo da qualidade da rede fora dos grandes centros. O mesmo estudo que apontou que 81% das pessoas com 10 anos ou mais usam a internet, da PwC Brasil com o Instituto Locomotiva, também revelou que apenas um terço da população pode ser considerada plenamente conectada.

Outros desafios perpassam o próprio custo da mídia digital. “A alta demanda trouxe também alguns desafios para os custos de mídia digital, como ocorrido no final de 2021 durante a corrida por consumidores online na Black Friday e no Natal, fazendo com que parte do inventário de mídia digital sofresse uma grande valorização e aumentos em seus custos de uma forma fora do padrão. Deste modo, acredito que o desafio está em manter a atratividade de investimentos para anunciantes e suas agências, mesmo em tempos de grande busca por soluções digitais”, explica Fabio Urbanas, da WMcCann.

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